A (nova) declaração de inexistência de conflitos de interesses
O Regime Geral da Prevenção da Corrupção (RGPC) foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 109-E/2021, de 9 de dezembro, no âmbito da Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-24.
De forma a garantir os objetivos da estratégia para as entidades públicas, foram estabelecidas várias disposições que visam assegurar a transparência administrativa, evitar conflitos de interesses, regular a acumulação de funções, implementar sistemas de controlo interno e promover a concorrência na contratação pública.
O artigo 13.º do referido Regime Geral da Prevenção da Corrupção determina que:
«As entidades públicas abrangidas adotam medidas destinadas a assegurar a isenção e a imparcialidade dos membros dos respetivos órgãos de administração, seus dirigentes e trabalhadores e a prevenir situações de favorecimento, designadamente no âmbito do sistema de controlo interno»,
Determina, ainda, o seguinte:
«Os membros dos órgãos de administração, dirigentes e trabalhadores das entidades públicas abrangidas assinam uma declaração de inexistência de conflitos de interesses conforme modelo a definir por portaria dos membros Governo responsáveis pelas áreas da justiça e da Administração Pública, nos procedimentos em que intervenham respeitantes às seguintes matérias ou áreas de intervenção:
a) Contratação pública;
b) Concessão de subsídios, subvenções ou benefícios; (…)»
Não existe um conceito legal tipificado de entidade pública que permita aferir, de forma direta e imediata, se as diferentes instituições, com naturezas próprias e específicas, devem ou não ser formalmente integrada no seu âmbito.
De um prisma substantivo, se a entidade é adjudicante, para efeitos do disposto no artigo 2.º do Código dos Contratos Públicos, no fundo se, direta ou indiretamente, mobiliza dinheiro público para a formação de contratos públicos, estará, em princípio, obrigada a observar as disposições legais relativas à contratação pública.
É certo que o Código dos Contratos Públicos já consagra uma solução de prevenção de conflito de interesses de âmbito semelhante, em todo o caso circunscrita aos membros dos júris nos procedimentos de contratação pública e aos gestores de contratos:
«Antes do início de funções, os membros do júri e todos os demais intervenientes no processo de avaliação de propostas, designadamente peritos, subscrevem declaração de inexistência de conflitos de interesses, conforme modelo previsto no anexo xiii ao presente Código e que dele faz parte integrante»,
cfr. artigo 67.º, n.º 4 do Código dos Contratos Públicos
«Antes do início de funções o gestor de contrato subscreve a declaração de inexistência de conflitos de interesse, conforme modelo previsto no anexo xiii ao presente Código»
cfr. artigo 290.º-A, n.º 7 do Código dos Contratos Públicos
Sublinhe-se que estas declarações são apenas emitidas quando os procedimentos são formalmente conduzidos e quando o contrato é reduzido a escrito.
O Código dos Contratos Públicos não prevê a emissão de uma declaração desta natureza para o órgão competente para a decisão de contratar, seja no momento em que define os termos e condições em que pretende abordar o mercado – a decisão de contratar -, seja no momento em que aceita a proposta apresentada ou escolha e melhor das apresentadas – a decisão de adjudicação.
Nessa medida, a integração entre o Código dos Contratos Públicos e o referido artigo 13.º do referido Regime Geral da Prevenção da Corrupção assume expressão e relevância na extensão da prevenção de conflito de interesses por parte de quem assume, no processo de contratação pública, a competência para a emissão de decisão vinculativa relativa ao compromisso contratual.
É certo que os decisores nos procedimentos de contratação pública já estão, na sua generalidade, abrangidos por dispositivos legais relativos a regimes de incompatibilidades e prevenção de conflitos de interesses, seja o Código do Procedimento Administrativo, o Regime Jurídico das Autarquias Locais, os Regimes Jurídicos do Setor Público Empresarial e do Setor Empresarial Local, o Estatuto do Gestor Público e até instrumentos de autorregulação, como códigos de ética, códigos de conduta e manuais de controlo interno.
A emissão necessária de uma declaração expressa por quem toma a decisão que vincula na contratação contribui para o processo de consciencialização, autoavaliação e autorresponsabilização, constituindo um momento necessário – porque formal – de reflexão crítica sobre esta matéria de transparência.
A Portaria n.º 185/2024/1, de 14 de agosto, aprova o modelo de declaração de inexistência de conflitos de interesses destinada aos membros dos órgãos de administração, dirigentes e trabalhadores das entidades públicas abrangidas pelo Regime Geral da Prevenção da Corrupção, com a redação seguinte:
[NOME], na qualidade de [MEMBRO DO ÓRGÃO DE ADMINISTRAÇÃO/ DIRIGENTE/TRABALHADOR], a desempenhar funções na [ENTIDADE ABRANGIDA PELO RGPC], declara, sob compromisso de honra, que, na presente data, relativamente ao presente procedimento [REFERÊNCIA], respeitante a [CONTRATAÇÃO PÚBLICA/CONCESSÃO DE SUBSÍDIOS, SUBVENÇÕES OU BENEFÍCIOS/ LICENCIAMENTOS URBANÍSTICOS, AMBIENTAIS, COMERCIAIS E INDUSTRIAIS/PROCEDIMENTOS SANCIONATÓRIOS], não se encontra numa situação de conflito de interesses nos termos do n.º 4 do artigo 13.º do Regime Geral da Prevenção da Corrupção, isto é, em situação em que se possa, com razoabilidade, duvidar seriamente da imparcialidade da sua conduta ou decisão, nos termos dos artigos 69.º e 73.º do Código do Procedimento Administrativo e do artigo 24.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
Mais declara, sob compromisso de honra, que se, no decurso do presente procedimento, vier a encontrar-se, ou previr razoavelmente vir a encontrar-se, numa situação de conflito de interesses, comunicará a situação ao superior hierárquico ou, na sua ausência, ao responsável pelo cumprimento normativo, nos termos do disposto no artigo 13.º do Regime Geral da Prevenção da Corrupção.
[DATA]
[ASSINATURA]
