Um preço suficiente para satisfazer as obrigações laborais e sociais
E, agora, sintética e telegraficamente, algumas ideias fundamentais extraídas da apreciação que o Supremo Tribunal Administrativo fez a uma problemática relacionada com o preço anormalmente baixo.
Cumprimento das normas laborais…
Não cabe à entidade adjudicante fiscalizar o cumprimento de normas que se destinam a regular as relações entre os concorrentes e os respetivos trabalhadores.
A proposta violadora do disposto no artigo 70.º n.º 2, alínea f), do Código dos Contratos Públicos, não é aquela cujos preços não refletem os custos salariais e sociais, mas antes a que contém condição ou elemento contrários aos normativos legais e regulamentares em vigor, conduzindo a que o contrato celebrado, por aceitar essa incompatibilidade, desrespeite tais normativos.
A recomendação da ACT é meramente indicativa…
O que o Código de Contratos Públicos proíbe é que os concorrentes apresentem globalmente um preço anormalmente baixo, sob pena de exclusão (artigo 70º n.º 2 al. e) e artigo 71º do CCP), e não segmentadamente sejam apresentados os valores mínimos recomendados pela ACT.
Os valores dos preços finais insertos na recomendação da ACT são valores meramente indicativos, recomendados, não constituindo ou gozando de um qualquer valor impositivo obrigatório e absoluto como valor mínimo que importe ser estritamente observado sob pena de ilegalidade.
Sentido da vontade negocial do concorrente…
A proposta apresentada não tem por objeto o pagamento de remunerações que o concorrente se proponha pagar aos seus colaboradores, mas sim o preço dos serviços a prestar, a cobrar à entidade adjudicante.
Por isso, não se pode dizer que o concorrente, ao propor, quer os preços totais quer os parcelares, emita qualquer declaração tácita ou expressa, sobre quanto vai pagar aos seus trabalhadores, sendo abusiva e descontextualizada qualquer conclusão que a esse respeito se faça.
Para se concluir que o valor não chega…
Afirmar que o valor proposto pelo concorrente se mostra insuficiente para satisfazer as obrigações laborais e sociais em que está constituída, determina que se conclua estar perante uma proposta com um preço anormalmente baixo.
Releva o preço contratual…
Os preços unitários não se integram no preço global da proposta, sendo que o artigo 71.º, n.º 2 do Código dos Contratos Públicos estabelece que «mesmo na ausência de definição no convite ou no programa do procedimento, o preço ou custo de uma proposta pode ser considerado anormalmente baixo, por decisão devidamente fundamentada do órgão competente para a decisão de contratar, designadamente, por se revelar insuficiente para o cumprimento de obrigações legais em matéria ambiental, social e laboral ou para cobrir os custos inerentes à execução do contrato».
O preço de uma proposta corresponde pois ao preço contratual proposto.
Deste modo, o n.º 2 do artigo 71.º do Código dos Contratos Públicos aplica-se ao preço global da proposta, e não a cada um dos preços unitários propostos, sendo que a lei apenas releva os preços anormalmente baixos dentro dos parâmetros globalmente definidos.
Os meros indícios…
Os preços parciais podem servir de elementos indiciários da anomalia do «preço global», não passando, no entanto, de meros indícios, o que não veio a ser confirmado em termos globais.
Como sumariado no Acórdão do STA de 21-04-2022, proferido no Proc. n.° 03/21.1BEBRG, “(…) “Para efeitos de ponderação de exclusão de proposta com fundamento na alínea f) do n.° 2 do art. 71° do CCP (…) tal como na alínea e) (…) não relevam preços parcelares relativos a partes de execução do contrato, em si mesmo considerados, sem prejuízo de estes poderem servir de elementos indiciários de tais violações ou da anomalia do preço global (…)”.
Assim se decidiu já no arranque deste ano de 2025, melhor descrito aqui.
