Contratos-programa celebrados pelas empresas locais
As empresas locais, independentemente de se reconduzirem à categoria de empresas de «gestão de serviços de interesse geral», previstas no artigo 47.º da Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto, ou à categoria de «empresas locais de promoção do desenvolvimento local e regional», disciplinada no artigo 48.º, celebram, com as entidades públicas participantes – municípios, as associações de municípios, independentemente da respetiva tipologia, e as áreas metropolitanas – contratos-programa, com periodicidade anual ou plurianual.
Os contratos-programa são instrumentos convencionais que devem definir detalhadamente o fundamento da necessidade do estabelecimento da relação contratual, a finalidade desta, os montantes dos subsídios à exploração concedidos, assim como a eficácia e a eficiência que se pretende atingir com a mesma, concretizando um conjunto de indicadores ou referenciais que permitam medir a realização dos objetivos setoriais.
Tanto os subsídios à exploração, como as indemnizações compensatórias visam assegurar o reequilíbrio financeiro das empresas em que, por virtude da atividade exercida, tal atribuição se justifique. Tal como os subsídios ao investimento (e as dotações de capital), os subsídios à exploração integram o esforço financeiro público e podem ter impacto relevante para a viabilidade da empresa local, constituindo, como é sabido, aspeto que pode conduzir à dissolução da empresa, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 62.º do apontado regime do setor empresarial local e das participações sociais.
Os subsídios à exploração constituem, então, verbas atribuídas à empresa com a finalidade de reduzir os custos ou de aumentar os proveitos, destinando-se, assim, a compensar os gastos incorridos na exploração. A atribuição, às empresas locais, de subsídios à exploração depende, sempre, da prévia celebração de contratos-programa com as entidades públicas participantes.
No caso de tais subsídios à exploração serem necessários em virtude da política de preços da empresa local, cumpre assegurar que:
- Está objetivamente justificada a política de preços e a razão decorrente do facto de as receitas operacionais anuais serem inferiores aos custos anuais;
- A empresa local tem implementado um sistema de contabilidade analítica, que permita identificar, com clareza, a diferença entre o desenvolvimento da atividade a preços de mercado e o preço subsidiado na ótica do interesse geral;
- A política de preços tenha sido objeto de prévia negociação com as entidades públicas participantes.
O contrato-programa terá de concretizar, de forma detalhada, as razões e a necessidade do estabelecimento da relação contratual. Uma das dimensões do estabelecimento da relação contratual está intimamente associada à necessidade de a empresa local receber, da entidade pública participante, os ditos subsídios à exploração. Por isso, a necessidade do estabelecimento da relação contratual prender-se-á com o facto da empresa, para cumprimento do seu objeto e atenta a natureza da sua atividade, precisar de compensar a diferença que sabe que existirá entre os gastos e os rendimentos da exploração.
E esse subsídio à exploração é determinado pela finalidade da relação contratual: no fundo, a empresa local é subsidiada porque o resultado das suas operações não é suficiente para cobrir os custos da exploração. Assim será tanto por força da natureza da atividade, como em virtude da forma escolhida para o exercício da atividade. Por isso, o fim da relação contratual haverá de estar associado aos objetivos que se pretendem sejam prosseguidos pela empresa local. A relação contratual a estabelecer é instrumental dos objetivos setoriais a prosseguir. Nessa medida, a finalidade da relação contratual passará por identificar os objetivos que o contrato-programa ajuda a alcançar.
Com a celebração do contrato-programa, a entidade pública participante pretende um dado nível de eficácia e de eficiência na atuação da empresa local. Logo, associados aos objetivos setoriais, deverão ser desenhados indicadores suscetíveis de medir a atividade da empresa em concretização do contrato-programa, indicadores que serão gizados numa lógica de:
- Disponibilidade, permitindo uma facilidade de recolha de informação;
- Simplicidade, de fácil apreensão e compreensão;
- Economia, permitindo a sua extração e análise com baixo custo de obtenção, sem dificuldade excessiva;
- Adaptabilidade, com flexibilidade suficiente a permitir uma adaptação à mudança, se necessária;
- Estabilidade, assegurando alguma permanência no tempo, permitindo a análise histórica;
- Rastreabilidade, facilitando a identificação da origem dos dados e a sua manutenção;
- Representatividade, atendendo às etapas críticas do processo, com suficiente abrangência.
Compete, em especial, ao fiscal único da empresa “emitir parecer prévio sobre a celebração dos contratos-programa celebrados nos artigos 47.º e 50.º”. O parecer referido no normativo legal, por ser “prévio sobre a celebração do contrato-programa”, incidirá sobre a minuta do contrato (e não sobre o contrato já outorgado). O parecer do fiscal único, no essencial, compreenderá um juízo fundamentado sobre o cumprimento, ou não, das exigências vertidas no artigo 47.º (e 50.º) para a celebração de contratos-programa com as empresas locais:
- Se existe necessidade de celebração do contrato-programa;
- Se essa necessidade resulta de fundamento suportado no quadro legal;
- Se estão fixados, mensurados e justificados os montantes atribuídos a título de subsídio de exploração;
- Se o contrato-programa define a eficácia e eficiência a alcançar, traduzidos em indicadores mensuráveis.
O parecer do fiscal único tem de ser comunicado à Inspeção-Geral das Finanças no prazo de 15 dias, conforme resulta do artigo 25.º, n.º 7. A lei não especifica quem comunica, se diretamente o órgão de fiscalização, se a administração da empresa local, embora se admita como razoável esta última solução.
Nos termos do artigo 5.º, n.º 1, alínea c), da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, compete ao Tribunal de Contas fiscalizar previamente os atos e contratos de qualquer natureza que sejam geradores de despesa ou representativos de quaisquer encargos e responsabilidades, diretos ou indiretos, para, entre outras, as entidades referidas na alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º, ou seja, as empresas locais (municipais, intermunicipais e regionais).
O artigo 47.º da citada lei exclui da fiscalização prévia – isentando– diversos tipos de contratos, como por exemplo, os contratos de arrendamento, bem como os de fornecimento de água, gás e eletricidade ou celebrados com empresas de limpeza, de segurança de instalações e de assistência técnica, contratos destinados a estabelecer condições de recuperação de créditos do Estado e outros.
A Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que aprovou o Orçamento do Estado para 2020, por via do seu artigo 402.º, introduziu uma importante alteração à Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, em matéria de incidência da fiscalização prévia do Tribunal de Contas, mais concretamente no leque das isenções previstas no artigo 47.º.
Assim, a recente alínea h) do artigo 47.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas passou a isentar de fiscalização prévia:
“Os contratos-programa, acordos e/ou contratos de delegação de competências, e respetivos atos de execução, celebrados entre autarquias locais, bem como entre uma autarquia local e uma entidade do setor empresarial local, por via dos quais sejam transferidas competências, constituído mandato para a sua prossecução ou assumido o compromisso de execução de determinadas atividades ou tarefas”
Com a apontada alteração à Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, tanto os contratos-programa, como os contratos celebrados entre as empresas locais e as entidades públicas participantes, ao abrigo do artigo 36.º da Lei n.º 50/2012, estão isentos de fiscalização prévia do Tribunal de Contas. Esta dispensa é independente do valor dos contratos ou dos instrumentos jurídicos representativos de despesa. Porém, estes contratos não deixarão de estar sujeitos à fiscalização sucessiva e concomitante pelo Tribunal de Contas, onde serão apreciados, entre outros aspetos, a legalidade, economia, eficiência e eficácia da gestão financeira do processo.
Em todo o caso, por força do disposto no n.º 7 do artigo 47.º da Lei n.º 50/2012, independentemente do cumprimento dos demais requisitos e formalidades previstos na lei, a celebração dos contratos-programa deve ser comunicada à Inspeção-Geral de Finanças e ao próprio Tribunal de Contas.
O Blog.gestada, em parceria com o Observatório das Autarquias Locais, está a estudar e a divulgar breves notas informativas relativas à temática da criação, organização e atividade das empresas locais, estruturas que constituem instrumentos empresariais vocacionados para a gerir, com eficácia e eficiência, competências municipais.