O suprimento de uma “condição” ao caderno de encargos é possível? Não… mas só se for mesmo uma condição!
O caso concreto
O Caderno de Encargos exigia que o técnico a ser proposto pelos concorrentes deveria cumprir o requisito mínimo de experiência profissional relevante de pelo menos 8 anos. A experiência dos técnicos apresentada pelos concorrentes nas respetivas propostas seria utilizada para efeitos de avaliação das mesmas e a experiência profissional indicada na proposta passaria a ser requisito contratual obrigatório.
Um concorrente propôs, para aquele efeito, um técnico com uma experiência profissional de 5 anos, inferior, portanto, ao requisito mínimo imposto no caderno de encargos.
O Júri propôs a exclusão da proposta. Foi entendido que aquela divergência não preenchia os requisitos do lapso de escrita enunciado no artigo 249.º do Código Civil.
Numa primeira interpretação jurisdicional, o Tribunal de primeira instância considerou que a proposta deveria ser excluída.
Entendeu que não haveria lugar à aplicação do instituto da prestação de esclarecimentos ou do suprimento de erros da proposta, consagrado no artigo 72.º do Código dos Contratos Públicos, uma vez que, mesmo admitindo que a divergência na indicação dos anos de experiência resultasse de um erro ou equívoco do concorrente, a alteração do técnico/experiência indicada na proposta consubstanciaria uma alteração dos elementos da proposta, alterando um atributo relevante para admissão e avaliação da proposta. O que não está consentido pelo n.º 2 do referido artigo 72.º.
Disse o Tribunal: “assim, alterar a experiência profissional proposta de 5 para 8 anos, colidiria com os princípios da intangibilidade das propostas e da concorrência já que tal apenas se destinaria a alterá-la e não restituir-lhe a sua “verdade original”. Donde se conclui que, ainda que se trate de um erro, este é unicamente imputável à Autora e apenas a si se deve (sibi imputet).”
Esta é a interpretação que, acreditamos, a generalidade dos júris em procedimentos de contratação pública tenderia a fazer da situação descrita.
O Tribunal de recurso condenou a entidade adjudicante a retificar o erro de escrita e a admitir a proposta apresentada.
O Tribunal de recurso entendeu: “(…) ser flagrante a desconformidade entre aquilo que anuncia como requisito daquela categoria de técnicos – 8 anos de experiência – e aquilo que, mesmo ao lado, na mesma linha, propõe, sendo como é certo que declarou conformar a sua proposta às exigências do Caderno de Encargos, é possível apreender o erro humano subjacente à descontextualização da referência a 5 anos de experiência profissional, ao invés dos 8 anos exigidos.”
Do lapso de escrito à condição ao caderno de encargos, uma fronteira pelos vistos muito ténue, a ser demarcada pelo Supremo Tribunal Administrativo em sede de revista (aqui).
