A não adjudicação porque “falhou” o financiamento comunitário!
Não há lugar à adjudicação quando, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 79.º do Código dos Contratos Públicos, circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de contratar o justifiquem.
Muitas entidades adjudicantes, para a promoção de projetos, iniciativas ou outro tipo de soluções destinadas à prossecução das respetivas atribuições – para a satisfação das necessidades coletivas – recorrem a financiamentos inscritos em programas nacionais e comunitários, ficando a realização de tais investimentos dependentes da elegibilidade das despesas e da concretização e efetivação dos financiamentos pretendidos.
Se a entidade adjudicante assumir e tiver como pressuposto, para a contratação dessas prestações, o financiamento de todo ou parte do preço a partir de programas para o efeito, poderá decidir pela não adjudicação caso o financiamento pretendido não venha a ser aprovado?
É indiscutível que o contexto em que as decisões de investimento são tomadas – seja no setor público, seja no setor privado – são determinantes para a decisão que se toma e os termos e condições da decisão tomada. São esses pressupostos que influenciam as opções de gestão e, nessa medida, o conteúdo, contornos, limitações e implicações das decisões, desejavelmente adequadamente vertidos nos documentos que as definem e caracterizam.
O suporte financeiro para o contrato que se pretende celebrar constitui um desses pressupostos indispensáveis, o ingrediente crítico e sem o qual o processo de formação da vontade negocial da entidade adjudicante ficará irremediavelmente inquinado.
Quando a fonte de financiamento é externa à entidade adjudicante, nem sempre é totalmente certa ou segura a garantia de que tal financiamento se efetivará: não apenas porque as verbas do financiamento podem ter de ser rateadas por diferentes interessados, mas também porque a candidatura, apesar de cuidadosamente instruída, pode não ser acolhida pelas entidades de controlo responsáveis pela aprovação e execução. Ou até porque, em virtude de vicissitudes do procedimento, no momento da adjudicação, a baliza temporal da execução contratual extravasará o prazo de execução física e financeira do programa de financiamento.
Nestes contexto, é prevenida a entidade adjudicante que acautela, na promoção de um procedimento de contratação pública sujeito a financiamento comunitário, que a adjudicação acontecerá se as referidas verbas vierem a ser efetivamente garantidas. É curial e transparente que esta cautela – esse pressuposto – seja partilhado com o mercado, de modo a que os interessados, quando apresentarem as suas propostas, também o façam com a consciência que a decisão de contratar da entidade adjudicante está sujeita a uma condição.
O conteúdo do ato administrativo encontra-se tipificado pelo legislador, pelo que os órgãos administrativos apenas podem utilizar modelos pré-estabelecidos.
Algumas vezes, o legislador deixa a possibilidade ao órgão administrativo de adaptar o conteúdo do ato às circunstâncias da vida.
Nestes casos, a administração exerce um poder discricionário, expresso através da adição de cláusulas particulares às disposições pré-fixadas. Para além do conteúdo principal (disposições diretamente resultantes da lei e cláusulas particulares), a administração pode, por vezes, anexar cláusulas acessórias, que não contribuem para modelar o conteúdo dispositivo do ato, ligando-se antes à sua eficácia ou à posição relativa dos intervenientes.
A faculdade de anexação ao ato administrativo de cláusulas acessórias (condição, termo, modo, reserva) encontra-se prevista no artigo 149.º do Código do Procedimento Administrativo.
A condição é a cláusula acessória através da qual se faz depender a eficácia do ato administrativo da verificação de um evento futuro e incerto.
Se até à verificação desse evento o ato não puder espoletar os seus efeitos, a condição diz-se suspensiva; se a ocorrência do evento fizer cessar os efeitos do ato, a condição diz-se resolutiva.
A condição é uma cláusula acessória porque a determinação do conteúdo principal do ato resulta das disposições diretamente prescritas pelo legislador e das cláusulas particulares, apenas ficando a produção de efeitos dependente do funcionamento da cláusula.
(Diário da República)
Assim, caso o pressuposto financeiro em que basear a decisão de contratar – nomeadamente o acesso aos fundos comunitários, com base numa candidatura previamente aprovada e que financiava em grande medida a prestação contratual – deixar de se verificar posteriormente a abertura do procedimento e apresentação das propostas por parte dos concorrentes, estará verificada a hipótese prevista no artigo 79.º, n.º 1, d) do Código dos Contratos Públicos.
De facto, a doutrina vem reconhecendo que o facto de a entidade adjudicante deixar de contar com verbas externas com que se contava e eram essenciais ao financiamento do empreendimento pode constituir uma alteração superveniente dos pressupostos da decisão de contratar, nomeadamente quando se demonstre que as mesmas eram essenciais ao financiamento.
Pode ser útil fazer refletir o circunstancialismo do financiamento nas peças do procedimento, de modo a que o mercado destinatário do procedimento de contratação esteja antecipadamente ciente e consciente de que a decisão de contratar está sujeita a essa condição.
É transparente, é leal, é prudente!

No âmbito da formação de contrato e desde que inscrita no programa de procedimento ou convite essa condição, creio podermos aplicar a caducidade da adjudicação nos termos referidos. Mas caso a adjudicação já tenha ocorrido e até sido outorgado o contrato, o recurso a esta norma já não é aplicável. Neste caso e mediante previa definição no caderno de encargos, entende-se que se poderá proceder à resolução do contrato nos termos do artigo 334.º, por remissão do artigo 330.º, alínea c)?
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Se a circunstância que inviabiliza a execução do contrato for superveniente à sua celebração, poderá existir uma situação de impossibilidade absoluta superveniente de realização da prestação contratual ou a perda de interesse (da motivação) da entidade adjudicante na realização do objetivo subjacente ao contrato. Nessa hipótese, porque o contrato, tal como configurado, não realiza já o interesse público (com os pressupostos que estiveram na base da decisão de contratar), a resolução com fundamento em interesse público pode constituir uma solução a explorar.
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