Ajuste direto

Os denominados «critérios materiais» na contratação pública constituem hipóteses legais que, uma vez preenchidas, autorizam a entidade adjudicante a celebrar contratos de qualquer valor por ajuste direto.

Por serem tão “apetecíveis” mas amplamente restritivos da concorrência, as ditas hipóteses que concretizam os critérios materiais constituem formulações fechadas, rígidas e circunscritas a situações delimitadas.

Este princípio-regra, enunciado no artigo 23.º do Código dos Contratos Públicos, está taxativamente concretizado em pressupostos ou hipóteses compreendidos em normas específicas: seja através de previsão para a generalidade dos contratos (no artigo 24.º), seja através de especificações em funções das tipologias de contratos, empreitadas de obras públicas (artigo 25.º), locação e aquisição de bens móveis (artigo 26.º) e aquisição de serviços (artigo 27.º).

A alínea c) do n.º 1 do referido artigo 24.º enuncia uma hipótese ou contexto em que se admite o recurso ao ajuste direto para a celebração de contratos por ajuste direto independentemente do respetivo valor.



Compreende-se que perante acontecimentos imprevisíveis que, pela sua natureza ou relevância, exijam a aquisição em contexto de mercado de prestações contratuais, tais contratações possam ser feitas sem concorrência – em interação direta com um só operador económico, portanto – se a resposta a assegurar a tais acontecimentos apresentar urgência!



No fundo, quando a entidade adjudicante se confrontar com um acontecimento surpreende, inesperado, no sentido em que um decisor público normal, face à informação disponível, ao contexto existente, ao historial passado, ao curso normal dos acontecimentos, não poderia prever – não era razoável que antecipasse, portanto – estará preenchido o acontecimento imprevisível que permitirá recorrer ao ajuste direto para a celebração de contratos de qualquer valor.

Pois bem, neste ano de 2025, não se prevê que venham a ocorrer incêndios de grande dimensão!!!

Como não? A sério?

A sério!

Como é isso possível?

Porque o legislador assim o disse!

Pois, mas o povo diria que não, que em 2025, com toda a probabilidade, os incêndios de grande dimensão voltarão a ocorrer, potencialmente com mais gravidade e impacto, não só em Portugal, mas também no resto do mundo, como, aliás, já se antecipa na tragédia em curso, a esta data, na Califórnia, Estados Unidos da América.

Reza o artigo 291.º do Orçamento do Estado para 2025, aprovado pela Lei n.º 45-A/2024, de 31 de dezembro:



Para combater estes eventuais acontecimentos – que, com quase toda a segurança não terão lugar em Portugal, dado que são pura e simplesmente «imprevisíveis» – poderão ser adquiridos bens ou serviços no momento por ajuste direto, dado que seria excessivo planear a resposta antecipada a acontecimentos possíveis, mas tão improváveis!

E se porventura, em 2025, acontecer o impensável: incêndios de grande dimensão em Portugal, a aquisição urgente de tais prestações contratuais poderá realizar-se sem que o Tribunal de Contas antecipadamente audite:



A planear imprevisibilidades, ninguém nos bate!

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