Afinal qual é a finalidade das sanções contratuais pecuniárias? É só prevenir e sancionar ou também… ressarcir?
O Supremo Tribunal Administrativo voltou a pronunciar-se sobre a finalidade das sanções contratuais pecuniárias, abordando especificamente a questão de saber se o contraente público pode recorrer ao mecanismo sancionatório depois de terminada a vigência do contrato.
O Tribunal debruça-se, assim, sobre a questão com especial interesse prático para a gestão dos contratos públicos de saber qual é, afinal, o limite temporal da aplicação das multas contratuais.
E, no fundo, a pertinência do juízo coloca-se no seguinte: pode o adjudicatário – por exemplo, um fornecedor de bens ou um prestador de serviços – ser penalizado depois de o contrato já se encontrar integralmente executado? Mesmo que a prestação tenha sido defeituosamente executada, isto é, com atraso na entrega ou com a entrega de bem defeituoso ou com a conclusão do serviço já depois do termo do prazo fixado para o efeito?
Neste seu mais recente Acórdão, o Supremo Tribunal Administrativo vem sublinhar que apesar de existirem já diversas decisões jurisprudenciais sobre a matéria, com enquadramentos de facto e de direito distintos, naturalmente, uma coisa é certa e segura: em todas as decisões se partiu de um pressuposto comum de que as decisões por incumprimento dos contratos administrativos devem ser aplicadas no âmbito da sua vigência.
Entende-se, portanto, que «o poder sancionatório do contraente público, tendo por finalidade prevenir e sancionar o incumprimento contratual por facto imputável ao contraente privado, assume, principalmente, caráter penal e compulsório».
Esta ideia é sustentada da perceção de que se o valor da sanção – prevista no artigo 329.º do Código dos Contratos Públicos – está fixado em termos percentuais rígidos, ou seja, em milésimo do montante da prestação, não está a considerar o dano sofrido, ou seja, a repercussão na esfera jurídica do contraente público do atraso ou deficiente cumprimento. Por isso, o seu caráter é penal(ização).
Por outro lado, o seu caráter é igualmente compulsório porque se vai prolongando no tempo, enquanto o cumprimento perfeito não é reposto, no fundo constituindo um instrumento de «pressão» sobre o contraente particular.
Neste enquadramento, conclui o Tribunal:
«Ora, se o cumprimento do contrato já se deu integralmente, não havendo mais nada a dissuadir» – porque, entretanto, o serviço foi realizado, porque o bem foi entregue, porque a obra está concluída – «não faz sentido que o contraente público lance mão do poder sancionatório, que apenas se poderia justificar se lhe reconhecêssemos uma função ressarcitória dos eventuais prejuízos sofridos pelo incumprimento contratual».
Porém, insiste o Supremo Tribunal Administrativo:
«A multa contratual não tem, no entanto, a natureza de uma cláusula penal, como decorre do disposto no número 1 do artigo 296.º do Código dos Contratos Públicos, que distingue claramente as “sanções pecuniárias aplicadas nos termos previstos no contrato” (alínea a) das “importâncias fixadas a título de cláusulas penais” (alínea c)».
Ou seja, se o cumprimento contratual se mostrar deficiente em virtude de atraso do contraente privado na realização da sua prestação – a conclusão do serviço contratado ou a entrega do bem a fornecer, por exemplo – mas, no momento em causa, a prestação já tiver sido efetivamente concretizada, não existe objetivo penal e compulsório a cumprir.
Nesse caso poderá existir, isso sim, o ressarcimento de eventuais danos causados ao contraente público, mormente através da aplicação de uma eventual cláusula penal consagrada para esse efeito. Aplicação de uma sanção contratual pecuniária, ao abrigo do artigo 329.º do Código dos Contratos Públicos, isso é que não!
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