Temos mesmo de avaliar o preço…ou melhor…pode o preço não ser avaliado?
O Código dos Contratos Públicos, no seu artigo 74.º, consagra duas modalidades para a avaliação das propostas apresentadas a um procedimento de contratação pública, ambas reconduzidas a um único critério admissível: o da «proposta economicamente mais vantajosa»:
(i) A modalidade da «melhor relação qualidade-preço», na qual o critério de adjudicação é composto por um conjunto de fatores, e eventuais subfatores, relacionados com diversos aspetos da execução do contrato a celebrar;
(ii) A modalidade da «avaliação do preço ou custo», quando um desses referenciais é o único aspeto da execução do contrato a celebrar submetido à concorrência.
O artigo 75.º do Código explicita regras relativas à forma de concretização do critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa, ligando-o umbilicalmente ao objeto do contrato a celebrar. E compreende-se que assim seja.
O critério de adjudicação, se tem um objetivo instrumental no procedimento – permitir a comparação, entre si, das propostas apresentadas, a sua ordenação e hierarquização e, no derradeiro momento, a recomendação de adjudicação – representa mais do que isso, traduzindo, em boa verdade, um desafio ao mercado para otimizar a solução contratual definida no caderno de encargos pela entidade adjudicante, tornando a realização do interesse público mais plena do que aquela que resultará da mera base contratual definida nas peças do procedimento.
O preço constitui, por norma, um dos elementos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, por representar um aspeto concorrencial de excelência, multiplicador de eficiência na aplicação dos recursos públicos. Porém, já antes da revisão ao Código dos Contratos Públicos, promovida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, tanto a doutrina como a jurisprudência aceitavam não ser forçoso que o preço constituísse um aspeto submetido à concorrência, podendo não ter, portanto, tradução no critério de adjudicação.
Com a reformulação do artigo 74.º do Código, o legislador veio esclarecer, no n.º 2, que «em casos devidamente fundamentados, a entidade adjudicante pode optar por não submeter à concorrência o preço ou o custo, caso em que estabelece obrigatoriamente um preço fixo ou um preço máximo no caderno de encargos».
A formulação usada pelo legislador – «em casos devidamente fundamentados» – sublinha que a margem de discricionariedade da entidade adjudicante neste específico domínio é menos ampla do que aquela que goza quando operacionaliza, com recurso a outros aspetos, o critério de adjudicação.
Ou seja, o preço só poderá ser descartado do critério de adjudicação se a entidade adjudicante fundamentar, de forma devida, isto é, razoável, credível e sustentada, que, no contrato que pretende celebrar, aquele é um aspeto cuja apreciação não promove o enriquecimento da proposta e não é determinante nem concorre para a boa realização da despesa pública.
Diga-se, como nota de rodapé, que não deixa de ser curioso que o legislador declare que o «preço ou o custo» não tem necessariamente de integrar o critério de adjudicação e, ainda assim, tenha denominado as suas modalidades de «melhor relação qualidade-preço» e «avaliação preço ou custo», impossibilitando a aplicação prática desta última e, no que toca à primeira, destruindo a relação com a qualidade, o que, convinhamos…não se faz…