«A culpa é, obviamente, do fornecedor: não tem qualidade e parece estar falido!»
Quando promove um concurso público, a entidade adjudicante, com a publicitação do anúncio em jornal oficial – obrigatoriamente no Diário da República e, eventualmente, no Jornal Oficial da União Europeia -, sabe antecipadamente que a escolha do cocontratante responsável pela execução do contrato público terá como matéria exclusiva de análise as respostas que os concorrentes vierem a dar ao desafio traçado no caderno de encargos.
Neste tipo de procedimento, qualquer operador económico devidamente habilitado pode apresentar proposta. Aliás, como vai mantendo a jurisprudência, a aferição da legitimidade da participação dos interessados no concurso público é verificada após a escolha do adjudicatário, precisamente na fase de habilitação.
O concurso público é, portanto, um procedimento aberto ou de livre acesso a todos os operadores económicos que atuam no mercado e em que, estruturalmente, para a entidade adjudicante, não é relevante apreciar a qualidade técnica do sujeito executante ou a sua robustez financeira. Quando promove um concurso público, a entidade adjudicante sabe – ou, pelo menos, assim o assume – que para a boa execução do contrato, é suficiente a específica habilitação do adjudicatário, a ser demonstrada com a apresentação dos documentos de habilitação.
Aliás, a tentativa de avaliar, nos concursos públicos, as características de per si dos concorrentes inquinará inevitavelmente a decisão de adjudicação, considerando que o legislador foi claro e peremptório ao determinar, no n.º 3 do artigo 75.º do Código dos Contratos Públicos, que os fatores e subfatores do critério de adjudicação não podem dizer respeito, direta ou indiretamente, a situações, qualidades, características ou outros elementos de facto relativos concorrentes.
Já o concurso limitado por prévia qualificação será um tipo de procedimento mais adequado a reforçar, para o contraente público, as garantias de capacitação técnica e financeira do executor do contrato, que se traduzirá, em princípio, em confiança acrescida numa boa e pontual concretização dos compromissos assumidos na proposta escolhida.
Este procedimento tem natureza bifásica, desenvolvendo-se, assim, em dois momentos: na primeira fase – de qualificação –, o candidato terá de evidenciar que preenche os requisitos mínimos de capacidade técnicos e ou financeiros exigidos no programa do procedimento.
Cumprida aquela triagem, na segunda fase do concurso, serão convidados a apresentar proposta os, agora, concorrentes, assim se limitando a disputa concorrencial às entidades qualificadas na primeira fase.
Por isso, apesar de tendencialmente mais demorado, porque integrado por dois distintos momentos de avaliação, não é indiferente para a entidade adjudicante – para a garantia de adequada satisfação contratual – promover um concurso público ou um concurso limitado por prévia qualificação.
Se no concurso público a escolha do colaborador para a execução do contrato público é feita com base numa única avaliação – o mérito da proposta -, no concurso limitado por prévia qualificação, a entidade adjudicante formula um duplo juízo.
Aprecia, primeiramente, a qualidade dos candidatos, qualificando quem cumpre os requisitos de qualificação ou, em modelo alternativo, aquele número de candidatos que melhor os cumpre. Garantida que está a qualidade dos concorrentes, desafia-os seguidamente a competirem para a melhor proposta.
Existe, naturalmente, o risco de os concorrentes não apresentarem a qualidade técnica e a sustentabilidade financeira desejável para a concretização do objeto do contrato. Mas está ao alcance da entidade adjudicante, sobretudo em contratos complexos, duradouros ou com especiais exigências de realização, prevenirem os riscos dessas ocorrências, adotando um tipo de procedimento que as autorize a, pelo menos, avaliarem essas dimensões.
Não há dúvida de que, não raras vezes, a culpa pelo ineficaz desempenho contratual é, obviamente, do fornecedor, por não ter nem qualidade técnica, nem sustentabilidade financeira. Mas as entidades adjudicantes têm também a responsabilidade de minimizar os riscos para o erário público quando definem a solução de contratação. E o concurso limitado por prévia qualificação pode ser um instrumento útil para esse efeito.
Fundamental é que as entidades adjudicantes escolham o procedimento por referência aos interesses primordiais do investimento que promovem e não, como acontece por vezes, por consideração de critérios marginais, como a celeridade, a facilidade burocrática ou a sistematização rotineira.
E tudo começa numa estratégia organizacional: olhar o procedimento de contratação como uma oportunidade de bem contratar e não apenas como uma formalidade a observar!