O Código dos Contratos Públicos em revisão: também a complicar o que é simples!
O artigo 128.º do Código dos Contratos Públicos regula a figura do ajuste direto simplificado, permitindo-se que as entidades adjudicantes contratem a aquisição ou locação de bens móveis e aquisição de serviços, bem como empreitadas de obras públicas sem necessidade de adotarem um prévio procedimento pré-contratual formal.
O recurso a esta figura é possível, na regra do n.º 1 do artigo 128.º, se o valor a contratar a celebrar não for superior a € 5.000, 00, no caso das locações e aquisições de bens e serviços, ou a € 10.000, no caso das empreitadas de obras públicas.
Estando em causa a celebração de contratos circunscritos aos apontados valores, dada a baixa representatividade financeira do investimento, o legislador aceita que «a adjudicação possa ser feita pelo órgão competente para a decisão de contratar, diretamente, sobre a fatura ou um documento equivalente apresentado pela entidade convidada, com dispensa de tramitação eletrónica».
No fundo, a dispensa de tramitação eletrónica – com o envio de um convite e a apresentação de uma proposta – constitui o elemento simplificador desta modalidade de ajuste direto: a decisão de contratar, a adjudicação e a faturação são simultâneas e formalizadas diretamente na fatura ou documento equivalente!
Ora, este ajuste direto é simplificado porque não tem formalidade. O procedimento inicia-se e conclui-se ao mesmo tempo que se receciona o título para pagamento. E, não tendo o procedimento a formalidade caracterizadora da sucessão de atos, não oferece substrato suscetível de ser tramitado eletronicamente.
Como medida especial de contratação pública, prevista no artigo 2.º, n.º 1, alínea b) da Proposta de Lei n.º 41/XIV/1.ª, avança-se a possibilidade das entidades adjudicantes recorrerem ao ajuste direto simplificado, nos termos do artigo 128.º do Código dos Contratos públicos, quando o valor do contrato for igual ou inferior a € 15.000,00, e desde que o contrato tenha por objeto a execução de projetos cofinanciados por fundos europeus, não se distinguindo por tipicidade de prestação.
Escreve-se na proposta que as entidades adjudicantes «podem iniciar procedimentos de ajuste direto simplificados» (e concluir, acrescentamos nós), formulação surpreendente, dado que, na prática e como se viu, o procedimento de ajuste direto inicia-se e concluiu-se de forma instantânea, em simultâneo com a realização da prestação contratual.
Porém, exige o n.º 3 do artigo 2.º, que este procedimento simplificado específico – por envolver a aplicação de financiamento comunitário – tramite através de plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante.
Esta imposição de formalidade apresenta uma nova dificuldade à entidade adjudicante: criar uma formalidade, que o tipo de procedimento pela sua natureza dispensa, para tramitar na plataforma eletrónica já que… nem mesmo a fatura ali tramitará, dado que a sua emissão terá de obedecer ao regime jurídico da faturação eletrónica…
Enfim, parece que o ajuste direto simplificado pode ficar mais… complicado…
Tem de se fazer chegar este e outros reparos à proposta de diploma antes da sua aprovação, sob pena de se complicar (ainda mais) quando se pretende exatamente o contrário.
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