O Código dos Contratos Públicos em revisão: “a amizade não tem limites?”
O n.º 2 do artigo 113.º do Código dos Contratos Públicos impede as entidades adjudicantes de convidarem a apresentar propostas, em procedimentos de consulta prévia, entidades a quem já tenham adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores, na sequência precisamente de consultas prévias, contratos de empreitada de obras públicas com preços contratuais acumulados que ultrapassem o limiar definido na alínea c) do artigo 19.º – € 150.000,00 – ou contratos de locação, aquisição de bens ou serviços com preços contratuais acumulados que ultrapassem o limiar definido na alínea c), do n.º 1 do artigo 20.º – €75.000,00.
No fundo, o legislador cerceou a possibilidade das entidades adjudicantes constituírem mercados «cativos», «fornecedores privilegiados», «parceiros regulares», pelos perigos que tal opção, quando está em causa a aplicação de dinheiros públicos, constitui para a igualdade de tratamento, a transparência de processos e para o eficiente funcionamento do mercado – e otimização das soluções contratuais – potenciado pelo leal jogo concorrencial.
Como medida especial de contratação pública, prevista no artigo 2.º da Proposta de Lei n.º 41/XIV/1.ª, avança-se a possibilidade das entidades adjudicantes adotarem o procedimento de consulta prévia quando o valor do contrato for inferior aos limiares referidos nos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 474.º, consoante o caso, desde que o contrato tenha por objeto a execução de projetos cofinanciados por fundos europeus.
Vingando esta proposta, as entidades adjudicantes poderão contratar empreitadas que concretizem investimentos até mais de € 5.000.000,00, cofinanciados por fundos europeus, por consulta prévia a cinco entidades. Do mesmo modo, poderão adquirir bens e serviços, também por consulta prévia, que representem investimentos superiores a €200.000, nos casos de entidades adjudicantes que não o Estado.
E tudo isto com o especial “benefício” de, a tais consultas, não se aplicarem as limitações constantes, designadamente, do n.º 2 do artigo 113.º do Código dos Contratos Públicos, como aponta o n.º 2 do artigo 2.º da Proposta de Lei n.º 41/XIV/1.ª.
Ou seja, os operadores económicos que venham a executar contratos na sequência destas consultas prévias, poderão acumular múltiplas e sucessivas adjudicações (e recursos financeiros), sem que a entidade adjudicante se veja “forçada” a recorrer a outros operadores económicos.
Esta proposta de alteração legislativa foi submetida à matriz de risco blog.gesdata, que avalia o impacto das soluções no cumprimento dos princípios fundamentais que presidem à formação e execução de contratos públicos, não sendo possível apresentar os resultados por sobreaquecimento da aplicação em alguns parâmetros de análise, designadamente os da transparência, concorrência e igualdade de oportunidades.