O caso da contratação de segurança privada com prejuízo
A Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, já alterada pela Lei n.º 46/2019, de 8 de julho, que disciplina o exercício da atividade de segurança privada, no seu artigo 5.º-A, proíbe expressamente a contratação com prejuízo, em particular a prática do dumping social, atendendo ao espectro alargado e competitivo do mercado da segurança privada.
A questão muito debatida neste particular – e relativamente à qual o Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou – prendendo-se com a interpretação daquela específica norma legal, centrou-se em determinar se a dita proibição de contratação com prejuízo deve ou não ser interpretada como uma proibição aplicável a cada específico contrato a celebrar de segurança privada, ou antes em função do cômputo de todos os serviços prestados num dado período de tempo.
A resolução desta dúvida terá reflexos imediatos na aplicação ou não da alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos, que impõe a exclusão de propostas cuja análise revele «que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais e regulamentares aplicáveis».
O Supremo Tribunal Administrativo entendeu muito recentemente que a proibição de contratação com prejuízo, prevista no referido artigo 5.º-A da Lei n.º 34/2013, se integra no campo da proteção social e de concorrência de um setor económico, que tem de ser controlado pelas autoridades próprias de fiscalização do setor e de fiscalização das condições de trabalho.
São essas as entidades a quem cabe aplicar as contraordenações em caso de violação daquelas regras de proteção social e da concorrência, como resulta do artigo 61.º da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio.
Por outro lado, a regra da proibição de contratação com prejuízo tem de ser analisada em face de cada empresa e não de cada contrato celebrado pela empresa, pois nada na lei aponta em sentido contrário, nem um tal sentido (de aplicação a cada contrato) é extraível dos elementos da interpretação jurídica.
Nessa medida, para que se mostre preenchida a hipótese de «contratação com prejuízo» não basta aferir se a regra da proteção prevista no assinalado artigo 5.º-A da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, está comprometida individualmente em cada contrato, mas antes e sim se a mesma está ferida no âmbito dos diversos contratos celebrados pelo operador económico.
Por isso, para que o júri possa propor a exclusão de uma proposta com fundamento no disposto na alínea f), do n.º 2 do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos, teria de apurar uma contratação com prejuízo no cômputo global dos contratos celebrados pela empresa, avaliação que extravasa manifestamente o alcance de informações disponíveis no procedimento.
Encontra o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo aqui.