Ajuste direto

Região Autónoma dos Açores | medida excecional de contratação pública

O Decreto-Lei n.º 168/2019, de 29 de novembro, aprovou medidas excecionais de contratação pública, por ajuste direito, para a formação de contratos de empreitada de obras públicas, de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços relacionados com danos causados pelo furacão Lorenzo, que atringiu, nos dias 1 e 2 de outubro de 2019, a Região Autónoma dos Açores.

A intempérie causou danos naquela Região Autónoma que se repercutem, sobretudo, em habitações, explorações agrícolas, equipamentos de apoio à pesca e empreendimentos de comércio e turismo. O furacão provocou, também, danos significativos em infraestruturas rodoviárias e portuárias.

Por esses motivos, o Governo, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 180/2019, de 8 de novembro, decretou a situação de calamidade na Região Autónoma dos Açores, por um período de dois anos.

O artigo 28.º da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, e pela Lei n.º 80/2015, de 3 de julho, já estabelece um regime especial de contratação de empreitadas de obras públicas, fornecimentos de bens e aquisição de serviços, que tenham em vista prevenir ou acorrer, com caráter de urgência, a situações decorrentes dos acontecimentos que determinaram a declaração de situação de calamidade.

Em situações de calamidade, e mediante despacho dos Ministros da Administração Interna e das Finanças, é publicada a lista das entidades (adjudicantes) autorizadas a recorrer à medida excecional de contratação pública e que se concretiza no seguinte:

(i) Entidades adjudicantes: as indicadas na lista publicada;

(ii) Prazo de duração da medida excecional: durante dois anos;

(iii) Tipo de procedimento que pode ser usado: ajuste direto;

(iv) Limitação de valor: formação de contratos cuja estimativa de custo global por contrato, não considerando o IVA, seja inferior aos limiares previstos para a aplicação das diretivas comunitárias sobre compras públicas;

(v) Natureza das prestações a contratar: empreitada de obras públicas, aquisição de bens e aquisição de serviços;

(vi) Fiscalização jurisdicional: os contratos, independentemente do valor, são dispensados do visto prévio do Tribunal de Contas;

(vii) Prestação de informação: as adjudicações de contratos feitas ao abrigo do presente regime excecional devem ser comunicadas ao Ministério da Administração Interna e ao Ministério das Finanças, de forma a garantir o cumprimento dos princípios da publicidade e transparência da contratação.

O legislador entendeu que «há determinadas realidades do regime da contratação pública que não são abrangidas pela previsão do referido artigo 28.º da Lei de Bases da Proteção Civil», justificando, com esta asserção, a criação deste outro regime excecional: que, se bem se entende, permitirá às entidades adjudicantes recorrerem ao ajuste direto para a formação de contratos públicos não abrangidos pelo regime específico compreendido na referida Lei de Bases da Proteção Civil.

O Decreto-Lei n.º 168/2019, de 29 de novembro, inclui, desde logo, a possibilidade de adquirir, por ajuste direto, locações, prestação cuja natureza não está incluída no elenco de tipos contratuais previstos no artigo 28.º da Lei de Bases da Proteção Civil.

Por outro lado, os contratos públicos a celebrar ao abrigo deste regime excecional não se destinam, somente, a prevenir ou acorrer, com caráter de urgência, a situações constituídas pela situação de calamidade – medidas preventivas, cautelares ou restitutivas de urgência; assumem uma amplitude mais significativa, mas têm de estar “relacionados” com os danos causados pelo furacão Lorenzo: «intervenções necessárias à recuperação dos danos causados nas áreas especificamente afetadas pelo furacão, cujo reconhecimento de elegibilidade, inventariação e quantificação exata são fixados por despacho do Primeiro-Ministro (…), bem como às ações necessárias a garantir o abastecimento de bens, designadamente mercadorias e combustíveis, à ilha das Flores».

O artigo 2.º deste Decreto-Lei n.º 168/2019, de 29 de novembro, enquadra as consultas por ajuste direto na alínea c) do n.º 1 do artigo 24.º do Código dos Contratos Públicos, «na medida do estritamente necessário e por motivos de urgência», parecendo, assim, não dispensar a entidade adjudicante de concretizar fundamentadamente estes pressupostos.

Nesse medida, para aproveitar o regime, não bastará “invocar o Lorenzo”! Será necessário estabelecer o nexo causal entre o Lorenzo, os danos verificados, a urgência na reparação e a natureza estritamente necessária do objeto do contrato para dar satisfação à necessidade resultante da calamidade.

Outra característica atípica deste regime excecional de ajuste direto resulta do dever imposto às entidades adjudicantes de, «sempre que possível», convidarem três entidades distintas para a apresentação de propostas, aproximando este ajuste direto da figura da consulta prévia. Não está, portanto, na livre disponibilidade das entidades adjudicantes consultar somente um operador económico. Essa consulta exclusiva só poderá ocorrer quando a consulta plural não for possível, opção que deve ser motivada em critérios de exequibilidade e não de mera oportunidade ou conveniência.

Claro que estando o procedimento de contratação suportado numa motivação de urgência, ainda que sejam convidadas três entidades a apresentar proposta, poderá ser sempre dispensada audiência prévia dos interessados, por aplicação do princípio inscrito na alínea a), do n.º 1 do artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo.

Dada a urgência que motiva o regime excecional, o legislador autoriza, no artigo 3.º, n.º 2 do referido Decreto-Lei n.º 168/2019, de 29 de novembro, que os contratos produzam todos os seus efeitos antes da sua publicação no portal dos contratos públicos, exceto quanto aos pagamentos a que derem causa.

Estes contratos – ao contrário daqueles que tenham sido formados por ajuste direto ao abrigo do artigo 28.º da Lei de Bases da Proteção Civil – não estão dispensados da fiscalização prévia do Tribunal de Contas.

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