Fiscalização prévia

Dispensa de fiscalização prévia de contratos com valor até 749.999,99 €

O artigo 48.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, aprovada pela Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, e já objeto de diversas alterações, estabelecia, no n.º 1 do seu artigo 48.º, que «as leis do orçamento fixam, para vigorar em cada ano orçamental, o valor, com exclusão do montante do imposto sobre o valor acrescentado que for devido, abaixo do qual os contratos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 46.º ficam dispensados de fiscalização prévia.»

Todos os anos, o Orçamento do Estado determinava o valor que constituía o limiar abaixo do qual os contratos sujeitos à fiscalização prévia do Tribunal de Contas ficavam dela dispensados.

Os contratos abrangidos pela dispensa são os contratos de obras públicas, aquisição de bens e serviços, bem como outras aquisições patrimoniais que impliquem despesa, quando reduzidos a escrito por força da lei. Para aquela dispensa são consideradas, igualmente, as minutas dos contratos de valor igual ou superior ao fixado nas leis do Orçamento – nos termos do dito artigo 48.º -, cujos encargos, ou parte deles, tenham de ser satisfeitos no ato da sua celebração.

O valor da dispensa, inscrito nas diferentes leis orçamentais, tem vindo a ser, há já diversos anos, 350.000 €, tendo este referencial sido mantido em 2020, na Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que aprovou o Orçamento do Estado para 2020.

A lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, procedeu à alteração de diversos diplomas legais, entre os quais à dita Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, reformulando o artigo 48.º, passando, o seu n.º 1, a estabelecer o seguinte:

«Ficam dispensados de fiscalização prévia os contratos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 46.º de valor inferior a 750.000 €, com exclusão do montante do imposto sobre o valor acrescentado que for devido».

São duas as alterações fundamentais que resultam da assinalada modificação legislativa: por um lado, o limiar para a dispensa de fiscalização prévia mais do que duplica, retirando ao controlo prévio do Tribunal de Contas os contratos cujo preço contratual se fixa no intervalo entre os 350.000 € e os 749.999,99 €. Por outro lado, o referencial da dispensa deixa de ser fixado anualmente na lei do orçamento do Estado e passa a estar definido – com maior estabilidade e perenidade, portanto – na própria Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas.

Não deixa de ser evidente que os interesses dos contribuintes – a auditoria à aplicação dos dinheiros públicos através de instrumentos contratuais – ficam menos salvaguardados e, sobretudo, mitiga-se a pressão para uma acutilância organizativa das entidades adjudicantes no processo de contratação pública, por diminuírem os riscos de ineficácia na concretização dos investimentos por vícios no processo de formação contratual.

Será que o legislador poderia ter sido imaginativo e implementado soluções de controlo que, sem “entupir” o Tribunal de Contas, predispusesse mecanismos de autorregulação e compliance que motivassem as entidades adjudicantes a manter os níveis de rigor no processo de contratação, mesmo quando tais instrumentos estivessem isentos de fiscalização prévia por terem valor inferior a 750.000 €?

E se tivesse sido aditado um n.º 3 ao artigo 48.º da Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, que determinasse que «os contratos dispensados de fiscalização prévia, nos termos do n.º 1, de valor igual ou superior a 350.000 €, devem ser comunicados ao Tribunal de Contas no prazo de 30 dias contados da sua outorga, instruídos com toda a documentação exigida aos contratos não dispensados de fiscalização prévia, acompanhados de um relatório de auditoria interna realizada ao processo de formação do contrato pela entidade adjudicante, que obedecerá aos formulários a serem aprovados por resolução do Tribunal»?

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