Sanções contratuais

Vai uma sanção contratual pecuniária depois da receção provisória? O Supremo vai dizer como é…

Nos termos do disposto no artigo 329.º n.º 1 do Código dos Contratos Públicos, o contraente público pode, a título sancionatório, resolver o contrato e aplicar as sanções previstas no contrato ou na lei em caso de incumprimento pelo cocontratante.

A sanção contratual – que ganha especial relevância no contexto da execução das empreitadas de obras públicas – tem uma dupla função ou natureza:

(i) Preventiva ou dissuasora (compulsória): com os objetivos semelhantes à coima aplicada por incumprimento de obrigações de conduta;

(ii) Reintegradora ou indemnizatória: constituindo a liquidação dos prejuízos sofridos pelo contraente público pelo atraso, valor esse que o empreiteiro terá que pagar independentemente de o valor dos prejuízos reais ser superior ou inferior àquele.

A aplicação de sanções contratuais representa um poder-dever do contraente público, que se impõe em todos os casos em que a sanção seja necessária e adequado à produção daqueles objetivos, sendo também por isso, determinante o momento da sua aplicação.

O Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março, diploma que, antes da entrada em vigor do Código dos Contratos Públicos, disciplinava a contratação e a execução das empreitadas de obras públicas, estabelecia, no n.º 4 do seu artigo 233.º, que «feita a receção provisória, não poderá haver lugar à aplicação de multas contratuais correspondentes a factos ou situações anteriores».

Recorde-se que a receção provisória é o ato pelo qual o dono da obra, na sequência da vistoria à mesma e por ocasião da sua conclusão, aceita a obra como bem executada e sem defeitos aparentes, constituindo, nessa medida, a aceitação da prestação principal do empreiteiro.

Era, como se viu, pacífico, no quadro do anterior regime jurídico, que o dono da obra não podia aplicar ao empreiteiro qualquer sanção contratual pecuniária para penalizar a mora no cumprimento do contrato e ressarcir-se do prejuízo se, entretanto, tivesse sido já declarada a receção provisória da obra. Assim o proibia o referido artigo 233.º, n.º 4, do aludido Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março.

Com a entrada em vigor do Código dos Contratos Públicos, aquele impedimento expresso desapareceu, não tendo sido transposto para o artigo 403.º, autorizando a interpretação – pelo menos formal – de que o legislador não pretendeu, no Código, instituir a restrição temporal à aplicação das sanções que vigorava anteriormente.

E a pertinência desta leitura podia ser reforçada com a constatação de que o instituto da aplicação de sanções contratuais pecuniárias, no caso das empreitadas de obras públicas, mantinha, em tudo o mais, sensivelmente o mesmo regime regulatório.

Desde 2008 que a dúvida e o debate se instalou no mercado das obras públicas, com os empreiteiros, repetidamente, invocarem a receção provisória como facto impeditivo da aplicação de sanções contratuais pecuniárias, e donos de obras públicas a contrariarem aquela leitura invocando a ausência de proibição legal, admitindo, portanto, que tais sanções podem ter lugar até à data da elaboração da conta final, momento em que, aí sim, se «acertam as contas»!

O Supremo Tribunal Administrativo admitiu, em fevereiro deste ano, a revista de um acórdão confirmativo da sentença anulatória do ato aplicador de uma multa contratual – no âmbito de uma empreitada e já após a receção provisória da obra – por entender ser necessário que o Supremo defina se o artigo 403.º do Código dos Contratos Públicos pode ser ativado nessa fase.

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