Escrita em língua portuguesa ou acompanhada de tradução devidamente legalizada
Nos termos do disposto no artigo 58.º do Código dos Contratos Públicos, «os documentos que constituem a proposta são obrigatoriamente redigidos em língua portuguesa». O português é, assim, o idioma regra na contratação pública.
A apresentação de documentos da proposta noutros idiomas é admissível nos casos em que tal esteja expressamente previsto nas peças do procedimento.
De facto, admite-se no n.º 2 do aludido artigo 58.º, que «em função da especificidade técnica das prestações objeto do contrato a celebrar, o programa do procedimento ou o convite, podem admitir que alguns dos documentos» da proposta «sejam redigidos em língua estrangeira, indicando os idiomas admitidos».
Já os documentos que o concorrente entenda por bem apresentar, mas sem o serem exigidos no regulamento do procedimento – referidos no artigo 57.º, n.º 3 do Código dos Contratos Públicos – «podem ser redigidos em língua estrangeira, salvo se o programa do procedimento dispuser diferentemente».
Recorde-se que o n.º 4 do artigo 132.º do Código permite às entidades adjudicantes a parametrização de regras que entenda adequadas à consecução dos interesses inscritos no procedimento, conquanto se circunscrevam ao cumprimentos dos princípios ordenadores da contratação pública:
«O programa do concurso pode ainda conter quaisquer regras específicas sobre o procedimento de concurso público consideradas convenientes pela entidade adjudicante, desde que não tenham por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência»
O cumprimento das determinações do programa do procedimento pode ser essencial, atendendo à possibilidade de cominação da exclusão das propostas em caso de irregularidade, tal como se admite na alínea n) do n.º 2 do artigo 146.º do Código dos Contratos Públicos:
«No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas: (…) que sejam apresentadas por concorrentes em violação do disposto nas regras referidas no n.º 4 do artigo 132.º, desde que o programa do concurso assim o preveja expressamente»
Porém, sem prejuízo da liberdade que se concede à entidade adjudicante, no que toca aos documentos “facultativos“, da conjugação entre o artigo 58.º, n.º 1 e o artigo 146.º, n.º 2, alínea e) do Código, a proposta que não esteja escrita em português, quando o programa do concurso não regule diferentemente, deve ser excluída.
No seu Acórdão n.º 4/2022, de 25 de janeiro, o Tribunal de Contas é claro ao considerar, a este propósito e por ocasião da temática das formalidades essenciais, o seguinte:
«A ficha técnica do produto, sendo um documento exigido no programa do procedimento, que contém os termos ou condições relativas a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a Entidade Adjudicante pretende que o concorrente se vincule, integra a proposta apresentada pelo concorrente.
A formalidade da apresentação da ficha técnica do produto redigida em português, ou não o sendo, da apresentação de uma tradução devidamente legalizada, acompanhada de uma declaração de prevalência, estando determinada como obrigatória – na lei e nas peças concursais – e sendo, também, a sua inobservância cominada, em termos expressos, com a exclusão da proposta do concorrente, deve ter-se como uma formalidade essencial.
Tal formalidade é também uma formalidade ad substantiam, pois através da mesma visa-se garantir que o concorrente se vincula relativamente às características e especificações que constam daquela ficha, quer na parte escrita em português, quer na parte escrita em idioma estrangeiro, o que se faz por via da tradução apresentada e da declaração de prevalência.
No caso, a não entrega da tradução e da declaração de prevalência impediu que o júri ficasse a conhecer de forma perfeita ou completa a proposta apresentada.
A obrigação legal da proposta ser entregue de forma perfeita num dado momento procedimental, claramente definido, visa informar o júri de forma total e completa da intenção do concorrente contratar respeitando certos atributos, termos e condições.
Visa, ainda, salvaguardar os princípios da concorrência, da igualdade e da transparência e o subprincípio da estabilidade ou da imutabilidade das propostas.
Logo, a preterição de tal formalidade não se enquadra no âmbito do art.º 72.º, n.º 3, do CCP.
Se, no caso concreto, ficou provado que a formalidade essencial que foi preterida não ficou alcançada por outro meio, não pode tal formalidade essencial degradar-se em não essencial para efeitos de se salvar a proposta apresentada.»
Tudo isto, mais e melhor, aqui.