Um breve (enfadonho mas indispensável) enquadramento legal
Os organismos e entidades da Administração Pública, por aplicação da Lei de Enquadramento Orçamental, estão sujeitos ao princípio da sustentabilidade financeira: a capacidade de financiar todos os compromissos assumidos ou a assumir, com respeito pela regra do saldo orçamental estrutural e pelo limite da dívida pública.
Os compromissos, conceito explicitado na Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, são obrigações de efetuar pagamentos a terceiros em contrapartida da aquisição de bens e serviços. Os compromissos consideram-se assumidos quando é executada uma ação formal pela entidade, como sejam a emissão de ordem de compra, nota de encomenda ou documento equivalente, ou a assinatura de um contrato, acordo ou protocolo.
Os compromissos podem, também, ter um caráter permanente e estar associados a pagamentos durante um período indeterminado de tempo, nomeadamente salários, rendas, eletricidade ou pagamento de prestações diversas.
Por isso, à luz daquele princípio da sustentabilidade financeira, nenhuma despesa pode ser autorizada ou paga sem que, cumulativamente:
O facto gerador da obrigação de despesa respeite as normas legais aplicáveis;
A despesa disponha de inscrição orçamental,
A despesa tenha cabimento na correspondente dotação;
A despesa esteja adequadamente classificada;
A despesa em causa satisfaça o princípio da economia, eficiência e eficácia.
Nessa medida, apenas podem ser assumidos compromissos de despesas após os competentes serviços de contabilidade exararem informação prévia de cabimento no documento de autorização da despesa em causa. Pretende, assim, o legislador que não se proceda ao cabimento orçamental e ao compromisso de despesas sem que os fundos monetários necessários para o pagamento estejam disponíveis.
Os fundos disponíveis são, assim, as verbas monetárias disponíveis a muito curto prazo e que resultem:
Da dotação corrigida líquida de cativos, relativa aos três meses seguintes;
De transferências ou subsídios com origem no Orçamento do Estado, relativo aos três meses seguintes;
Da receita efetiva própria que tenha sido cobrada;
Da previsão da receita efetiva própria a cobrar nos três meses seguintes;
Do produto de empréstimos contraídos nos termos da lei;
Das transferências ainda não efetuadas decorrentes de programas e projetos de fundos estruturais, cujas faturas se encontrem liquidadas e devidamente certificadas ou validadas;
De outros montantes autorizados, resultantes do aumento temporário de fundos disponíveis;
De saldos transitados do ano anterior cuja utilização tenha sido autorizada;
Dos recebimentos em atraso existentes entre as entidades sujeitas à Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, desde que integrados em plano de liquidação de pagamentos em atraso da entidade devedora no respetivo mês de pagamento;
Da receita relativa a ativos financeiros e a outros passivos financeiros.
Os sistemas de contabilidade de suporte à execução orçamental têm de emitir um número de compromisso válido e sequencial. Esse número é inscrito na ordem de compra, nota e encomenda ou documento equivalente.
Preterindo-se este procedimento, o contrato ou a obrigação subjacente em causa é, para todos os efeitos, nula.
Por outro lado, a falta de fundos disponíveis para suportar as despesas com o contrato celebrado constitui facto gerador de nulidade do compromisso e, consequentemente, do próprio contrato, nos termos previstos nos artigos 5.º, n.ºs 1 e 3 da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, e artigo 7.º, n.ºs 2 e 3 do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho, normas com natureza imperativa e que revestem natureza financeira.
Tanto a nulidade como a violação direta de normas financeiras constituem fundamentos de recusa de visto aos contratos submetidos à fiscalização prévia do Tribunal de Contas, por aplicação das alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas.
Lei de Enquadramento Orçamental, aprovada pela Lei n.º 91/2001, alterada pela Lei n.º 41/2014, de 10 de julho | Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em atraso, aprovada pela Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro, alterada pelas Leis n.ºs 20/2012, de 14 de maio, 64/2012, de 20 de dezembro, 66-B/2012, de 31 de dezembro e 22/2015, de 17 de março | Decreto-Lei que regulamenta a Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho, alterado pelas Leis n.ºs 64/2012, de 20 de dezembro, 66-B/2012, de 31 de dezembro, e 99-B/2015, de 2 de junho.